A corrida bilionária de big techs pela IA está impulsionando centenas de bilhões de dólares em dívidas
Grandes empresas de tecnologia, com enormes necessidades de financiamento para sustentar suas ambições em inteligência artificial, estão firmando acordos de dívida de proporções gigantescas no ritmo mais acelerado em anos, aproveitando o apetite quase insaciável dos investidores para garantir recursos destinados a iniciativas cujo retorno final ainda é incerto.
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As empresas estão acessando todas as frentes do crédito e encontrando compradores prontos. Apenas nos mercados públicos de títulos dos EUA, as big techs levantaram cerca de US$ 157 bilhões até agora neste ano — um aumento de aproximadamente 70% em relação ao mesmo período do ano passado, segundo dados compilados pela Bloomberg.
A Oracle liderou o movimento, com quase US$ 26 bilhões em dívidas de negociação pública vendidas, grande parte em uma oferta colossal feita na quarta-feira, à medida que se prepara para gastar bilhões alugando data centers e abastecendo-os com chips da Nvidia para clientes de inteligência artificial como a OpenAI.
"Este é o sinal mais recente de que o boom de investimentos em IA, há muito tempo o foco dos mercados de ações, agora está se espalhando para o crédito", escreveu Johnathan Owen, membro da equipe de gestão de portfólio de grau de investimento da TwentyFour Asset Management, em carta a investidores na manhã de quinta-feira.
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Gigantes como a fabricante de chips Broadcom, a Alphabet e a Apple também entraram no movimento para captar, juntas, dezenas de bilhões de dólares — algumas delas pela primeira vez em anos. Enquanto isso, a controladora do Facebook está levantando US$ 29 bilhões em crédito privado para um data center, e bancos estão organizando um pacote de dívida de US$ 38 bilhões para ajudar a Vantage Data Centers a construir instalações que serão alugadas pela Oracle.
Os acordos abrangentes — e em alguns casos incomuns — são uma prova das necessidades descomunais de financiamento da corrida pela inteligência artificial, e do papel central que os mercados de dívida estão prontos para desempenhar. Para os compradores de títulos, trata-se de uma aposta de que os investimentos das empresas não superarão a demanda e de que elas terão condições de pagar seus credores mesmo décadas à frente. Até agora, os investidores parecem mais do que dispostos a aceitar o risco, sem deixar muita margem para erros.
O apetite por títulos de grau de investimento está tão forte que os spreads — o rendimento extra que os investidores exigem para manter dívidas em vez de títulos do Tesouro — caíram para perto de seu nível mais baixo em 27 anos. Dívidas de gigantes de tecnologia altamente avaliadas, em particular, atraíram investidores ansiosos para embarcar no hype em torno de produtos e infraestrutura de IA.
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A Oracle conseguiu ampliar sua megavenda de títulos nesta semana para US$ 18 bilhões, contra cerca de US$ 15 bilhões previstos inicialmente, graças à forte demanda — tornando-se o segundo maior acordo de grau de investimento deste ano, atrás apenas da oferta de US$ 26 bilhões da Mars para financiar a aquisição da Kellanova. A empresa de software também recebeu cerca de US$ 88 bilhões em pedidos no pico, com demanda final de cerca de US$ 82 bilhões. Parte dessas dívidas só vence em 40 anos.
A taxa de desistência da oferta — cerca de 4% dos pedidos de investidores que caem durante o processo de venda — foi significativamente menor que a média de 21% registrada neste ano. A emissão da Alphabet em abril registrou demanda sete vezes maior que a oferta, bem acima da média de 3,8 vezes observada neste ano nas emissões de títulos de grau de investimento.
— Os dólares investíveis destinados à tecnologia estão superando de longe outros setores, com base no que temos visto — disse Matt Gannon, diretor do grupo de mercados de capitais de dívida do Barclays Plc, que não participou da venda da Oracle. — É um dos únicos setores que continua crescendo.
Até agora neste ano, empresas de tecnologia responderam por 8% das vendas de títulos corporativos de primeira linha nos EUA s a maior fatia desde 2021, ficando atrás apenas dos setores financeiro, de consumo discricionário e de utilidades, que também se beneficiaram da demanda por data centers.
Para alguns, a euforia em torno da IA traz semelhanças preocupantes com a bolha das dot-com (empresas da internet com domínio.com) que estourou no início dos anos 2000, além de temores de que o hype esteja inflado demais. Um estudo publicado em agosto pelo Instituto de Tecnologia de Massachusetts apontou que 95% das empresas que implementaram projetos-piloto de IA não obtiveram retorno sobre o investimento.
Outros destacam preocupações de longo prazo. Um relatório da Bain & Co. divulgado nesta semana previu que a receita das empresas de IA provavelmente ficará cerca de US$ 800 bilhões abaixo do necessário para bancar a capacidade de computação exigida pela demanda projetada até 2030.
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A construção de infraestrutura é muito cara, principalmente devido aos chips da Nvidia voltados para IA que irão equipá-la e à escala gigantesca de energia necessária. Neste verão, a Oracle fechou um acordo com a OpenAI para 4,5 gigawatts de energia em data centers, equivalente a cerca de quatro reatores nucleares. Só para um desses centros de dados no plano, a Oracle prevê gastar mais de US$ 1 bilhão por ano em geração movida a gás.
— Os valores que estão sendo investidos em mais capacidade de computação são, de certa forma, de cair o queixo — disse Damien McCann, gestor de portfólio de renda fixa do Capital Group.
Mesmo assim, investidores como McCann e analistas que acompanham o setor destacam que as empresas, em geral, têm balanços saudáveis — ou seja, não estão assumindo dívidas excessivas em relação aos lucros — e que suas classificações de crédito não mostraram sinais de deterioração.
Mais vendas de títulos podem vir de empresas de tecnologia ainda neste ano. Profissionais de mercado dizem que muitas dessas companhias com grande caixa optaram por não emitir dívidas no ano passado ou no início deste ano, preferindo esperar até que os rendimentos começassem a cair.
— Há uma necessidade bastante intensa de capex ao longo dos próximos cinco a dez anos por parte de muitas dessas grandes empresas de tecnologia — disse John Sales, chefe de sindicância de grau de investimento nas Américas no Goldman Sachs, que esteve entre os bancos que coordenaram a venda da Oracle. — E uma maneira importante de financiar parte dessas necessidades de despesas de capital é via dívida no balanço.
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