Master: rastro de prejuízos é bilionário, mas regras de risco devem ficar mais rígidas, preveem especialistas
Mesmo com um sistema bancário robusto, que não deve sofrer impacto com a liquidação do Master, ainda assim a derrocada da instituição de Daniel Vorcaro deixa um rastro de prejuízos bilionários para investidores que aplicaram mais de R$ 250 mil em CDBs do banco e letras financeiras, que não estão cobertos pelo Fundo Garantidor de Créditos (FGC), além de prefeituras e fundos de pensão que colocaram recursos nos títulos do Master. O próprio FGC sofrerá um baque de R$ 48 bilhões em seu caixa e bancos pequenos terão que pagar juros mais altos para fazer novas captações.
Mas especialistas avaliam que episódios como esse tendem a trazer regras de gerenciamento de risco mais rígidas, fazendo inclsuive com que o Banco Central seja menos leniente com o modelo de remuneração adotado pelo Master.
—O prejuízo já foi consumado, atinge um universo restrito dos investidores brasileiros, mas o valor é vultuoso. Muitas vezes não se fazem mudanças na legislação de risco, mas a partir de casos concretos surgem novas regras, mais rígidas, de gerenciamento desse risco. Foi assim com a Lava Jato, que trouxe melhoria no compliance das empresas — explica Alexandre Chaia, professor no Ibmec e do Insper nas disciplinas de gestão de riscos financeiros e produtos bancários.
Chaia não vê danos ao sistema bancário e as pessoas e fundos de pensão continuarão fazendo investimentos buscando retornos mais interessantes. Mas no caso do Master havia o risco moral, num modelo de aplicações que se mostrou insustentável, e se baseava na garantia de que o FGC restituiria os investidores em caso de quebra do banco.
O professor prevê um aperto do BC na qualidade dos ativos oferecidos pelo mercado e até mesmo nas políticas da autoridade monetária, que, na sua avaliação, acabaram sendo lenientes, nos últimos três ou quatro anos, aceitando o crescimento de bancos com o modelo do Master. Para ele, o BC terá um freio de arrumação para refazer regras no contexto da liquidação da instituição, mas também das invasões de contas por hackers através de roubo de chaves e da operação Carbono Oculto.
— Trata-se de o fim de um ciclo em que BC e Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que fiscaliza o mercado de capitais, deixaram instituições financeiras com baixo nível de governança se expandirem — afirma Chaia, lembrando que Polícia Federal e Banco Central agindo juntos na liquidação de um banco não é um binômio comum.
O advogado Rafael Mortari, sócio da Mortari Bolico Advogados e especialista em direito processual civil, avalia que o caso Master tará duas duas frentes de mudança: a primeira será um aumento na contribuição ao FGC de bancos que ofereçam 'taxas distorcidas' aos clientes. Ou seja, quem oferece mais risco ao sistema, paga mais caro para ter a garantia.
— E acredito que o Banco Central deve endurecer as regras para que bancos com baixos índices de capital não possam usar a "etiqueta" do FGC como ferramenta de alavancagem predatória — afirma
Para o advogado, a liquidação do Master vai acelerar as discussões regulatórias sobre risco moral (moral hazard), já que o banco cresceu captando recursos via CDBs com taxas muito acima do mercado, atraindo investidores que ignoravam a saúde da instituição apenas porque contavam com a garantia do FGC.
Rastro de prejuízos bilionários
Embora, o FGC tenha exatamente a função de restituir investidores prejudicados pela quebra do banco, o caixa da instituição, de R$ 122 bilhões, sofrerá um baque de pelo menos R$ 48 bilhões — que terá que ser reposto pelos bancos contribuintes do fundo. São mais recursos saindo do caixa dessas instituições para cobrir o buraco deixado pelo Master.
A liquidação, segundo os especialistas, traz ainda um impacto indireto para bancos pequenos e médios, que terão que pagar juros mais altos para fazer captações no mercado, já que o caso Master aumenta a desconfiança do mercado sobre essas instituições.
Os exemplos de investimento em CDBs e Letras Financeiras do Master que trarão perdas é imenso. O Instituto de Previdência Municipal de Santo Antônio de Posse (Iprem), de São Paulo, tem R$ 8,2 milhões aplicados em titulos do Banco Master. O Iprem informou que ainda não dá para saber se haverá prejuízo e que aguarda informações sobre a possível recuperação do dinheiro. O investimento aparece no relatório de setembro do Portal da Transparência.
O ministério Público de Contas do Estado de São Paulo apurou-se que os RPPS (Regimes Próprios de Previdência Social) dos municípios de Araras, Cajamar, Santa Rita D´Oeste, Santo Antônio de Posse e São Roque aplicaram uma soma de cerca de R$ 218 milhões em títulos de renda fixa (letras financeiras) do Master. Letras financeiras oferecem retorno maior do que outros títulos de renda fixa, mas não são cobertas pelo FGC.
— As fundações e prefeituras têm regras mais rígidas de investimento e, muitas vezes, faltam ativos. Então, não dá para dizer que todo mundo que aplicou recursos no Master agiu de má-fé. É preciso investigar — afirma o professor Alexandre Chaia.