SKAMOONDONGOS - BELLA CIAO
Certos tempos clamam por certas canções Tais canções não envelhecem, pois se renovam nas medidas em que se fazem necessárias. Tais canções não se esvaziam de significado, pois seus significados pulsam com a mesma força das lutas que as reivindicam. Tais canções não tem donos, royalties ou autores, pois são compostas no anonimato heroico das lutas populares de emancipação. “Bella Ciao” é uma destas canções. Composta originalmente como uma canção de trabalho, cujo ritmo cadenciava - ao mesmo tempo em que denunciava - as péssimas condições de trabalho nas quais labutavam os colhedores de arroz na Região italiana de Modena, “Bella Ciao” tornou-se um hino da Resistenza italiana, organização armada que se opôs ao Governo fascista de Benito Mussolini e à posterior invasão Nazista no Norte da Itália, a partir de 1943. Composta por brigadas pertencentes às mais diversas tendências políticas como anarquistas, comunistas, republicanos, social-democratas, socialistas cristãos e monarquistas, “La Resistenza” atraiu membros de todas as classes sociais, sem distinção de idade ou gênero (as mulheres tiveram um papel fundamental na resistência antifacista. Algumas estimativas contabilizam mais de 35.000 combatentes mulheres), cujas diferenças eram subordinadas a um único objetivo: a derrota violenta do nazifascismo. Traduzida para dezenas de línguas e adaptada para os mais diversos estilos musicais, “Bella Ciao” transcendeu sua dimensão local, tornando-se um hino de combate ao fascismo em todo mundo. É uma canção de autoria anônima que nos conta a história de um partigiani – um guerrilheiro antifacista - que atende ao chamado da resistência para lutar contra os invasores. É uma canção que descreve o adeus de um combatente à sua companheira, levado a sacrificar sua vida em favor da liberdade no combate ao fascismo. “Bella Ciao” na fala de um tempo menos cínico, quando a flor que cresce sobre a cova de guerreiro insta as gerações que o sucedem tanto a nunca deixar de acreditar na construção de um mundo mais justo e humano, quanto jamais levantar a guarda para a besta raivosa do fascismo. Este é o momento que vivemos. O Neoliberalismo consolida violentamente o seu projeto de precarização nas periferias do sistema, arrasando direitos e pauperizando a vida de bilhões de seres humanos; seu gigantesco aparato ideológico é mobilizado para impedir sequer o sonhar de mundos alternativos e possíveis, ao mesmo tempo em que nos impõe o miasma temporal da mercadoria, que nos nega passado ou futuro; sob a lógica irracional de reprodução do Capital, adentramos no antropoceno, impotentes coletivamente para impedir uma hecatombe ambiental que se mostra cada vez mais inevitável e cuja realização se encontra gravada nas contradições insolúveis de um sistema claramente insustentável. E como se não bastasse, assistimos novamente à ascensão do nazi-fascismo em escala global, um processo que acompanha políticas de repressão em massa à ações resistentes das camadas sociais afetadas pelas necropolítica liberal. Mais uma vez o Capital mostra que não somente prescinde da Democracia, como a enxerga como um obstáculo, algo a ser violentado nos interesses de curto prazo, seja pela bota, pela repressão, pelo fuzil ou pela toga. Mesmo as políticas de governo mais moderadas que apontam para a defesa dos direitos sociais são varridas por golpes jurídico-midiáticos, apoiados e defendidos por hordas fascistas cujos ódios de classe, gênero e opinião produzem um número cada vez maior de vítimas entre mulheres, LGBTs, jovens negros e líderes de movimentos sociais. É justamente quando o fascismo entra no cio, disfarçado pela sobriedade das togas, que se faz necessário relembrar as antigas lutas e canções. Cada uma delas nos ensina a partir das gerações passadas que será apenas na superação da sociedade de classes que poderemos finalmente sepultar nossos monstros. Ouvir “Bella Ciao” é reafirmar a força de nossos ideais e reafirmar que a não daremos guarida ou trégua ao discurso odioso do Fascismo. Non Passarán! 1312 Por Pedro Toledo.