_A programação teve início com um momento de saudação, marcado pela presença de educadores, profissionais de saúde e integrantes de projetos comunitários vinculados ao SUS. Foto Clara Aguiar_
_Por Clara Aguiar | Porto Alegre (RS)
Do Brasil de Fato_
A 1ª Mostra de Agentes de Educação Popular em Saúde do Rio Grande do Sul foi realizada na manhã desta quarta-feira (3), no anfiteatro da Escola de Enfermagem e Saúde Coletiva da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), em Porto Alegre. O encontro teve como objetivo apresentar os resultados do processo formativo que, ao longo deste ano, capacitou 400 agentes na região Sul por meio do Programa de Formação de Agentes Educadores e Educadoras Populares de Saúde (AgPopSUS).
Aberta ao público, a atividade reuniu estudantes e profissionais da enfermagem, lideranças comunitárias, pessoas interessadas em saúde coletiva e representantes das turmas formadas no estado. O público pôde compartilhar experiências, desafios e aprendizagens acumuladas durante o percurso formativo, evidenciando a amplitude e o impacto do programa nos territórios.
A programação teve início com um momento de saudação, marcado pela presença de educadores, profissionais de saúde e integrantes de projetos comunitários vinculados ao Sistema Único de Saúde (SUS). A abertura celebratória preparou o ambiente para as reflexões que se seguiriam, ressaltando a força coletiva que sustenta a educação popular em saúde.
Ivone Oliveira, coordenadora do AgPopSUS no Rio Grande do Sul pelo Movimento de Mulheres Camponesas (MMC) e integrante da Irmandade Santa Izabel, em Vacaria — município localizado no nordeste do estado — compartilhou o seu sentimento ao ver os trabalhos expostos na mostra. Ela conta que se emocionou.
“Já comecei a chorar quando vi as companheiras e os companheiros montando a sua tenda ali para apresentar o resultado disso tudo. Porque é uma vitória muito grande dentro desse mundo da resistência que nós vivemos. Então, eu estou com muita alegria em dizer isso: que nós estamos aqui para dizer que educação popular vale a pena, e que a gente constrói o SUS, e que a gente constrói a saúde coletiva gratuita, de qualidade, para todo mundo, num processo educativo.”
_“Eu me emociono. Já comecei a chorar quando vi as companheiras e os companheiros montando a sua tenda ali para apresentar o resultado disso tudo”, comenta Oliveira. Crédito: Clara Aguiar_
#### **Educação Popular para transformar**
A diretora da Escola de Enfermagem e de Saúde Coletiva da UFRGS, Virgínia Moretto, ressaltou o compromisso da universidade com a educação popular e com a defesa do SUS: “Nós acreditamos na educação popular. Nós acreditamos em toda forma de educação. A Ufrgs é uma universidade inclusiva, é uma universidade democrática e é uma universidade que abre as portas. Ainda mais com colegas que estão engajados com as questões de promoção de saúde, de engajamento dos povos”.
Moretto também destacou que 2025 marca um ano simbólico, pois a a Escola de Enfermagem e Saúde Coletiva, da região Sul e do Brasil, completa 75 anos no dia 4 de dezembro. Em sua fala, reforçou a importância da defesa da universidade pública e da democracia, mencionando o impacto das eleições do próximo ano para a preservação dessas iniciativas.
“Estou aqui absolutamente comprometida e sempre abri as portas para esse tipo de evento. Porque a universidade é pública e a gente quer manter essa universidade desse jeito: pública. Mas este ano, nós temos que celebrar porque nós consolidamos a democracia neste país. E vocês sabem por que eu estou falando isso. Porque os generais que antigamente perseguiram pessoas, perseguiram colegas meus da universidade, hoje estão presos. Então, eu quero dizer para vocês a importância do ano que vem nas eleições, para a gente manter essa universidade pública e democrática”, complementou.
_A mostra teve como objetivo apresentar os resultados do processo formativo que, ao longo deste ano, capacitou 400 agentes na região Sul. Crédito: Clara Aguiar_
Fabiana Damásio, diretora da Fiocruz Brasília, e Osvaldo Bonetti, coordenador do AgPopSUS e do Núcleo Angicos da Fiocruz Brasília, participaram do evento por meio de vídeos enviados, nos quais saudaram os presentes e destacaram a importância do programa para o fortalecimento da Educação Popular em Saúde no país.
Damásio destacou a relevância do encontro como síntese do trabalho coletivo desenvolvido nos territórios. Em sua mensagem, ela afirmou a importância do momento de organização e visualização das práticas. “Nos dá a dimensão de quais foram os impactos que nós, juntos e juntas aqui, coletivamente, conseguimos construir nos territórios. E que será a base para a construção de outras possibilidades de formação.”
Segundo ela, a mostra é a síntese da experiência marcada pelo compromisso com o SUS. “A gente tem a dimensão da magnitude desse projeto tão potente e presente no território. Falamos de juventude, de feminicídios, da realidade da soberania alimentar e combate à fome, falamos de racismo e também de outros temas, como mudanças climáticas e desastres ambientais, e vimos a potência que é cada um de vocês que contribuíram para que o AgPopSUS se tornasse essa realidade.”
Já Osvaldo Bonetti trouxe a saudação e o agradecimento enquanto Fiocruz, instituição que segundo ele “tanto tem contribuído com a saúde pública brasileira, nos seus 145 anos de história, que tem uma marca nesse processo de conquista que é a Educação Popular em Saúde”. Ele destacou a “intensidade” e a “potência” do programa AgPopSUS, “que está junto do processo de retomada da nossa Política Nacional de Educação Popular em Sáude”.
Bonetti agradeceu ao governo federal e ao presidente Lula pelo investimento contínuo na política de democratização do SUS e deixou uma mensagem de solidariedade e reconhecimento aos educadores populares. Destacou que o trabalho representou um gesto de ousadia, apostando em uma inovação que resultou no “maior processo de formação da educação popular já existente no Sistema Público de Saúde”. Lembrou ainda que muitos atuaram sem a estrutura necessária ou retaguarda adequada, “porque realmente foi um processo de ousadia institucional e de cada um desses educadores”.
**Em defesa do SUS**
_“O SUS é do Brasil, é um sistema universal”, afirmou a presidente do Conselho Estadual de Saúde do Rio Grande do Sul (CES/RS), Inara Ruas. Credito: Clara Aguiar_
Representando a superintendente do Ministério da Saúde no estado, Maria Celeste, Lisandra Flores esteve presente no evento e reafirmou a importância do programa: “O AgPopSUS é necessário, esse é um momento tão importante que a gente não pode deixar de registrar que representa uma reafirmação dos princípios que fundamentam o SUS. A saúde nasce do encontro de saberes, territórios e lutas.”
Em nome da superintendente, lembrou que durante a pandemia de 2019 muitas ações dos movimentos sociais populares “foram fundamentais para salvar vidas”. Agradeceu ainda às coordenações, educadoras, educadores, conselhos e aos agentes, que contribuíram “dedicando seu tempo, sua energia e fé dentro dos cursos”.
_Ressaltando o papel dos movimentos sociais, Daiane Stefani, da coordenação nacional do AgPopSUS, reiterou: O foco do AgPopSUS, sobretudo, é essa iniciativa dos movimentos sociais populares. Crédito: Clara Aguiar_
Daiane Stefani, da coordenação nacional do AgPopSUS, ressaltou o papel dos movimentos sociais e explicou que o foco do programa nasceu das iniciativas dos coletivos populares, que antes não eram atendidos. Segundo ela, a partir da demanda está se construindo a Educação Popular em Saúde em territórios periféricos, urbanos, aldeias. Destacou ainda que, no Rio Grande do Sul, há inclusive uma turma formada por imigrantes, o que demonstra como o projeto “consegue construir educação popular em diversos territórios, nessa pluralidade”.
Stefanilembrou que o processo não foi simples. Disse que esteve no estado em julho de 2024, durante a formação e seleção das turmas, e que o período “foi muito desafiador, foi bastante cheio”, marcado pela reconstrução do cuidado nos territórios. Por isso, ver o que os participantes realizaram desde então é, segundo ela, motivo de grande gratificação e emoção.
_Aberta ao público, a atividade reuniu estudantes e profissionais da enfermagem, lideranças comunitárias, pessoas interessadas em saúde coletiva e representantes das turmas formadas no estado. Crédito: Clara Aguiar_
A enfermeira e presidente do Conselho Estadual de Saúde do Rio Grande do Sul (CES/RS), Inara Ruas, trouxe provocações às turmas ao abordar o avanço das propostas de privatização do SUS, institucionalizadas pela Agência Brasileira de Apoio à Gestão do SUS (AgSUS) e pelo chamado SUS Gaúcho — programa lançado pelo governador Eduardo Leite e pela titular da Secretaria da Saúde (SES), Arita Bergman. De acordo com as autoridades, o programa tem como objetivo unir esforços para reduzir filas de espera por consultas e cirurgias, facilitar o transporte de pacientes entre municípios e qualificar o atendimento nos pronto-atendimentos, entre outras prioridades.
“A gente tem que fazer política. Embora estejamos num governo progressista — e a gente quer continuar num governo progressista — esse é um papel fundamental para vocês, educandos, que vão atuar aqui no Sul: o SUS é do Brasil, é um sistema universal. Então, não existe SUS gaúcho, gente. Isso é uma estratégia de marketing, é marqueteiro, é até uma questão de falta de ética. ‘Quanto tempo o senhor esperava essa cirurgia? Agora o senhor conseguiu.’ Então, essas questões a gente tem que fazer a crítica, estar atentos”, disse.
_“Esse programa é muito importante para levar aos nossos territórios o nosso SUS na sua melhor forma”, afirmou a assentada do MST Isabel Cristina. Foto: Clara Aguiar_
#### Movimento poopulares celebram o programa
A agente Isabel Cristina, do assentamento da reforma agrária Filhos de Sepé do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), localizado em Viamão (RS), afirmou: “Em nome dos movimentos, eu quero dizer para vocês que é uma grande responsabilidade. Esse programa é muito importante para levar aos nossos territórios o nosso SUS na sua melhor forma. Nos mostrou que muitas das nossas educandas não tinham noção exatamente de como é o processo do SUS. E, a partir desse processo, desse acompanhamento que veio para os nossos territórios, a gente pode empoderá-las. Eu falo ‘elas’ porque a minha turma é essencialmente feminina. Eu sei que tem outras turmas que são mistas, mas a minha turma lá do assentamento, a turma Araucária, é essencialmente de mulheres. Então, a gente trouxe essa ferramenta. O AgPopSUS trouxe esse empoderamento.”
André Mombach, do Programa de Formação Paul Singer, destacou a articulação das formações populares para a construção da democracia. “Quero trazer um abraço muito caloroso do Programa de Formação Política dos Agentes de Economia Popular e Solidária, que atuam também nos territórios, nessa construção, na articulação das iniciativas associativas, cooperativas de trabalho e renda.”
Mombach explicou que o programa está na metade do primeiro ano da tarefa de entrar e se enraizar nos territórios, construindo junto aos movimentos populares das comunidades mais distantes. Disse que a política dos Agentes Populares de Saúde e dos Agentes de Economia Solidária incorpora uma missão expressa por Gilberto Carvalho, secretário nacional de Economia Popular e Solidária: “uma missão de construir, de reconstruir a democracia, a participação social, a participação popular nos territórios mais afastados. A gente tem essa capacidade. E fico muito feliz que esse programa seja gestado e construído pelos movimentos sociais e populares”.
_O público pôde compartilhar experiências, desafios e aprendizagens acumuladas durante o percurso formativo, evidenciando a amplitude e o impacto do programa nos territórios. Crédito: Clara Aguiar_
Rodrigo de Oliveira Azevedo, representante do Grupo Hospitalar Conceição (GHC), trouxe reflexões sobre o processo de educação popular: “Fazendo uma reflexão sobre a importância de nos reconhecermos como sujeitos de direitos: nos reconhecermos como sujeitos; cada um olhe para si mesmo. E, quando nos olhamos, não olhamos só para nós, olhamos também para as nossas culturas, para o nosso território, para a nossa história, e reconhecemos que temos direitos, assim como temos compromissos com todas as outras pessoas. Então, essa é uma hora de celebração, de festa, é uma hora de conclusão, mas não de encerramento”.
#### Reflexões
A mesa “Educação Popular em Saúde e Participação Social”, que teve como objetivo debater o papel da educação popular na construção de práticas de cuidado capazes de aproximar profissionais e comunidades, ampliando o diálogo e fortalecendo a autonomia dos territórios, reuniu também a educadora popular da Escola GHC, Ana Lúcia da Costa Maciel, e a enfermeira e educadora popular vinculada ao MMC e ao MST, Scheila Alves. Ambas compartilharam experiências ao longo do processo de formação dos agentes e destacaram que, além da dimensão pedagógica, o programa garantiu condições fundamentais — como alimentação e diárias para deslocamento — que asseguraram a permanência e o engajamento dos educandos durante todas as etapas. Elas reforçaram que essas ações foram decisivas para fortalecer o vínculo das participantes com a formação e para criar um ambiente verdadeiramente democrático e acolhedor.
_A mesa “Educação Popular em Saúde e Participação Social” teve como objetivo debater o papel da educação popular na construção de práticas de cuidado capazes de aproximar profissionais e comunidades. Crédito: Clara Aguiar_
Ao descreverem as metodologias adotadas, enfatizaram o papel das dinâmicas da educação popular, especialmente a construção coletiva de objetivos enquanto agentes promotores de saúde. Os encontros priorizavam a participação ativa, a escuta sensível e a elaboração conjunta de saberes, sempre orientados por temas geradores.
Outro eixo central do processo formativo foi o reconhecimento dos territórios: educandos e educandas foram incentivados a observar suas comunidades, identificar conflitos e potências locais e compreender de maneira aprofundada o contexto em que atuam. Segundo elas, o movimento de ida ao território, aliado às práticas dialógicas, consolidou a formação como um processo vivo, crítico e enraizado na realidade comunitária.
No período da tarde, ocorreu a Mostra das Turmas, momento em que os agentes apresentaram experiências, metodologias e ações desenvolvidas ao longo da formação, além de receberem certificados. A atividade reuniu relatos de projetos comunitários, vivências territoriais e iniciativas voltadas à promoção da saúde, o fortalecimento do protagonismo das comunidades e o tratamento mais humanizado do SUS.
_Editado por: Marcelo Ferreira_
* Whatsapp
* Facebook
* Twitter
* Copy