"They're trying to change our habits, because all of the projections rely on people becoming truly dependent on the technology. Whether or not it's actually a good thing for society isn't considered to be a factor."

[…] despacharam as encruzas, subiram o São Carlos e as escadarias da Penha, bradaram revividos em seus santos-cavalos nas matas e cachoeiras, celebraram os mortos na palma da mão.”

[…] Os nossos grandes inventores rufaram tambores, chamaram Zambiapungo e Olorum, riscaram o asfalto preenchendo de dança o intervalo entre as marcações do surdo, […]

[…] não pintaram os quadros do Renascimento, não foram convidados a frequentar bibliotecas, não compuseram sinfonias, não conduziram exércitos em grandes guerras, não redigiram as leis, não fundaram empresas e só frequentaram os salões empedernidos para servir às sinhás.

Recordo o frequentemente citado livro O Corpo Encantado das Ruas (Simas, 2019): “Para muitos é difícil admitir isso, mas os inventores do que há de mais forte na cidade do Rio de Janeiro não discutiram filosofia nas academias e universidades, não escreveram tratados, […]

[…] depois de pular o muro para buscar a bola isolada pelo amigo. Foi colo de avó depois de chutar um paralelepípedo com os pés descalços. Teve, ainda, o sabor de 7up.

Testemunhar essa conquista, no entanto, teve o poder de resgatar a criança de outro tempo. Foi como sentir novamente o chão fresco de caquinhos da vizinha […]

[…] o Botafogo ser campeão da Copa Libertadores da América e, quem diria, sem ajuda do Biriba, apenas com os dólares e euros de John Textor, presidente e dono da SAF. Algo impensável, assim como o Maurinho na seleção.

Os campos de terra, por sua vez, foram substituídos pelos virtuais dos jogos eletrônicos. Assim, o futebol, que antes encantava, parecia se extinguir. Quase duas décadas depois, assisti pela televisão [...]

A geral do Maracanã foi fechada, a arquibancada alterada inúmeras vezes, e o gigante veio abaixo, extinto, dando lugar a um estádio “padrão FIFA” — mas que poderia ser chamado de shopping center. O pay-per-view se consolidou; em seguida, veio o streaming.

Ali, me tornei e permaneci rubro-negro até o futebol — ou eu — perder o encantamento. E não levou muito tempo. Essa mudança, porém, coincidiu com transformações maiores que afetaram não apenas minha relação com o esporte, mas o próprio futebol.

[…] do ano seguinte não foram páreos para o gol de Rodrigo Mendes quatro anos depois. Foi nesse momento, no meio da Estrada José Rucas, que me vi abraçado a um transeunte qualquer — talvez embriagado, possivelmente um morador de rua —, gritando ‘Mengo!’ e comemorando o título carioca do Flamengo.

Séculos depois, o bairro manteve-se fiel às suas origens, e, na Penha, as marcas do passado e as celebrações populares ainda são um lembrete de como a cidade se reinventa, acolhendo quem por ali passa, inclusive eu.

Na celebração, as tias baianas prepararam as comidas, os portugueses se esbaldaram entre viras e fandangos e os bambas mostraram os sambas que tinham acabado de compor. A celebração da Penha transformou-se, depois do carnaval, no maior evento popular do Rio de Janeiro.”

A cidade, fundada um dia para expulsar franceses, resolveu ser francesa para esconder que era profundamente africana e lusitana. Nas brechas das festas, o carioca, encurralado pela repressão institucional, se virou e encontrou na Penha uma maneira de inventar a cidade negada.

De acordo com o livro O Corpo Encantado das Ruas (Simas, 2019):
“No início do século XX, a República criminalizava a cultura popular. A onda dos donos do poder era modernizar o Rio de Janeiro em padrões europeus, adotando Paris como modelo de conduta e urbanidade.

Subi os 382 degraus do Santuário de Nossa Senhora da Penha. Do alto da pedra, lembrei do português Baltazar de Abreu Cardoso e do milagre que deu vida à capela, que mais tarde se tornou uma basílica e deu origem à segunda festa mais famosa da cidade: a Festa da Penha, celebrada em outubro.